quarta-feira, 30 de setembro de 2020

Motivos para agradecer e ser feliz - a lista de setembro - Parte I

"Se tens um coração de ferro, bom proveito. O meu fizeram-no de carne e sangra todos os dias..." 

Esse pensamento de José Saramago, escritor português, Nobel de Literatura em 1998, é a fala da personagem Clara na peça de teatro de sua autoria: "A segunda vida de Francisco de Assis" (1987).

Em setembro meu coração sangrou muito. Ainda sangra e nem sei quando essa hemorragia vai cessar. Aqueles números do Covid transformaram-se em pessoas reais, próximas, queridas, com algum significado em nossas vidas. Ainda nos meses anteriores já sangrávamos pela cunhada da amiga, o tio da colega de trabalho, os tios e primos de outro companheiro de magistério, a mãe de uma professora que partilha a mesma rede de ensino... A irmã de nossa chefe, o irmão de nossa amiga poetisa... e tantas vítimas que foram se acumulando em nosso caderno de orações. 

Mas, neste setembro, perder a Euzinea, nossa companheira de jornada há 31 anos na Prefeitura foi muito dolorido... Foi rápido demais! Acompanhamos sua luta com a mãezinha querida, acamada, que despediu-se da Terra dia 29 de agosto. No dia 05 nossa amiga fez sua última postagem no Facebook. Dia 19, foi a vez de seu pai dizer adeus e no dia 20 nós estávamos a chorar sua despedida. Três vítimas em uma mesma família... É como se ela tivesse deixado assuntos inacabados... ainda aguardamos sua nova postagem nas redes sociais...

A vida na Terra é passagem, bem sabemos... Mas entre saber e sentir existe um hiato que ainda não foi preenchido por teorias ou frases feitas. Há que se ter muita vivência (e carne... e sangramento... e dor) para se fazer a ponte e talvez fundir essas duas ações.

"A consciência da fragilidade da vida foi um choque que nos fez ver a nós mesmos, que nos fez ter a vida em alta conta: a vida é rara, deve ser cuidada, cultivada, mantida." (Viviane Mosé,  Nietzsche Hoje, p.11).

Se meu coração sangra com a Euzinea, com a história da Viviane (não mais a Mosé) ele encontra-se estraçalhado. Em junho conhecemos Viviane, que veio adotar um daqueles cachorrinhos abandonados no Loteamento (vide as postagens de junho). Ela acabou levando a nossa "Floquinho" que virou sua Nina e agora será a Lindinha na família da Josi, Alexandre e Pietra. (Que confusão é essa, Alessandra?) Então...

Nesse ido de junho fizemos o registro da adoção, trocamos algumas "palavras", gravamos nossos contatos por WhatsApp e trocamos mensagens. Até que um dia chegou um vídeo e um áudio em que ela me dizia ter feito uma cirurgia para retirada de alguns tumores no cérebro. Mas que estava tudo bem. No vídeo, ela aparece sentada e Nina brinca alegremente ao seu redor.
Como essa adoção fez parte do pacote de castração gratuita, voltei a fazer contato na semana passada para avisar que já teriam que levar a cadelinha à clínica veterinária e, para minha surpresa - e grande impacto - a resposta veio de seu marido, dizendo-se agora viúvo, com duas crianças (um menino de 10 anos e uma menina de 2 anos) e que ele não teria condições de continuar a cuidar da Nina. Nós já tínhamos ficado sabendo de uma Viviane, vítima de Covid, mas não associamos a ela... E, então, as engrenagens aqui no coração não param de sangrar... A questão da Nina foi resolvida: nossa amiga Josi vai levá-la para o sítio para completar o trio de meninas super poderosas da Pietra. Fico feliz que Nina (que agora se chamará Lindinha) teve um desfecho feliz... Mas, e as crianças? Perderam a mãe... Perderam a cadelinha de estimação... Meu coração sangra por eles, pelo menino da foto, junto à mãe (os meninos amam tanto suas mães...).
No entanto, se há pessoas com nervos de aço como cantou Lupicínio Rodrigues, há outras com coração alado... E, como Fagner, desfolhamos nossos olhos e deixamos as lágrimas adubarem o solo de carne, plantando a fé, regando com a esperança e vendo brotar as flores  da gratidão e (possível) felicidade. Por isso, mantemos nossa MASF (Motivos para agradecer e ser feliz). Mas que, por razão dessa longa introdução, será publicada como Parte II.

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