domingo, 14 de fevereiro de 2016

"Então Ele veio..."

Em 1990 eu e minha irmã conseguimos alugar um apartamento na Avenida Souza. Nossa alegria foi tão grande que no primeiro dia em que fomos visitá-lo, resolvemos dormir por lá mesmo, em colchonetes buscados às pressas no quartinho onde morávamos. Foi uma emoção incrível. A sensação boa de pagar, com o suor do próprio trabalho, um espaço digno e aprazível de viver...
Tempos depois eu estava no Barão trabalhando e chegou um rapaz vendendo quadros. Quando O vi, um forte magnetismo nos ligou. Pensei: "quero comprar este quadro". Custava 40 Cruzeiros. No entanto, eu não tomaria essa decisão sem consultar minha irmã, até porque não dispunha do dinheiro e precisaria dar um cheque pré-datado para o próximo pagamento. Marquei com o rapaz no apartamento, no fim do dia. "Se ele for é porque confia que vou comprar o quadro; então poderei confiar também em dar o cheque..." Por volta das 17h30min uma Kombi velha, caindo aos pedaços literalmente, pára do outro lado da rua e o sujeito atravessa com o quadro debaixo do braço. Minha irmã já estava em casa e anuiu positivamente. Compramos nosso Cristo. Uma arte diferente. Pintura queimada sobre veludo. Assinada por J. Bernardes. Conversa vai... conversa vem... um copo de água, o cheque, recomendações para que não o depositasse antes da data e o moço vai embora. 
Ainda na sala, estudando as possibilidades de colocação na parede, escutamos as inúmeras tentativas do rapaz em ligar o motor da Kombi... Minutos depois ele bate novamente à porta e pergunta se não conhecíamos um mecânico de confiança. Não me lembro bem como conseguimos o telefone do nosso amigo Edivaldo Mulim nem onde fizemos a ligação, o fato é que nosso irmão do GEAP veio socorrer o pobre moço, que deve ter gastado muito mais que 40 cruzeiros na sua desventura. Quem sabe até o meu cheque não tenha ficado como forma de pagamento? Como saber...
Minha irmã deve ter me ajudado a pagá-lo (fazíamos tudo em comum acordo) e como tínhamos um trato que quem casasse primeiro deixaria tudo para a outra, fiquei com ele. 
Desde então me acompanha. Só saiu uma vez da minha casa: quando assumi a direção da Creche Djanira e quis levá-Lo para nos proteger (hoje não o faria).
Com a mudança para a casa nova, ele (o quadro) também ganhou uma renovada. E Ele continua com o mesmo magnetismo, lembrando-me, a cada dia, da nossa estrada de Damasco.
"Então Ele veio
E disse 'já é hora de seguir...'
E indicou um caminho tortuoso
Mostrou as pedras e os espinhos...
E quando viu que o medo assolava os nossos corações
Nos fez olhar o Sol atrás dos montes
Só disse: 'confiem e vão!'
Então viemos
Porque ninguém resiste ao Seu chamado
Voltamos à Terra-mãe que nos abriga
E por Seu amor, haveremos de amar...
E ao final da luta
Ele haverá de estar nos esperando
E erguerá a voz ao Pai num hino
Então dirá: 'Eis os Teus filhos enfim em Paz!'
Então viemos...
Porque ninguém resiste ao Seu chamado..."
No tempo da Creche

Em 1990, na Avenida Souza.

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