sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Entre a erudição e a poesia

De "Livro das Horas"
Nélida Piñon

  • " A cada dia aprendo a amar. A família, os amigos, a língua, as instâncias da vida e da arte. Tudo que ausculto e responde ao chamado. O que arfa, respira e acolhe-me sem eu haver pedido. Amar a quem me abraça sem pensar em me dar as costas. Amar a quem late, ruge, relincha e é bicho, como Gravetinho, alegria dos meus anos maduros. Amar a paisagem onde durmo e a humanidade repousa. Amar a descuidada língua dos homens em geral surdos, que recusam a ouvir os latidos do coração."
  • "Pensar é aliciador."
  • "...aspiro que minha derradeira expressão de vida seja prazerosa para quem me escute à beira do leito."
  • "Em qualquer circunstância, havia que fazer anotações."
  • "Preservo a cria com o alimento."
  • "... nos minutos de que dispomos, atualizamos a banalidade irrenunciável da vida."
  • "Minha vida mudou. A cada dia sou menos a Nélida que conheci até bem pouco tempo atrás."
  • "Suspeito que aprendi o valor da solidão com os filmes do oeste que enalteciam a vida interior, a realidade perigosa."
  • "Quisera às vezes jamais ter sido a mulher que ama o que há dentro de casa. E que, ao decidir ser escritora, renunciou à vida nas savanas, nas tundras, no deserto. A acampar, a viver em tendas varejadas pelo vento. Meu Deus, como sonho com uma vida que me converta em heroína."
  • "A mercadoria que trago é tecida por um intraduzível mistério, mas que encanta enquanto espero o inverno final."
  • "Ajo a esmo, como se habitasse um terreno baldio que acumula o lixo do mundo."
  • "Não passo de uma mulher que consome horas vergada sobre o papel a pretexto de perseguir uma frase que sirva ao menos de consolo."
  • "Não a via exatamente vaidosa, mas como quem cuidava do corpo enquanto apurava o espírito. Regia o cotidiano com harmonia." (sobre a mãe)

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